“Superou em muito as minhas expectativas o volume de recursos que o Ministério Público conseguiu trazer de volta no acordo com a Aegea S/A. Solicitei o bloqueio de R$ 18,3 milhões, mas serão R$ 40 milhões nos cofres do Daerp para solucionar problemas antigos, como desabastecimento de água. Valeu cada minuto dessa luta”.
A declaração é do vereador Marcos Papa (Cidadania) e refere-se ao acordo firmado entre o Ministério Público e a empresa Aegea para ressarcir os cofres públicos de Ribeirão por um dos quatro esquemas de corrupção desmantelados pela Operação Sevandija no dia 1° de setembro de 2016 – Papa denunciou três dos quatro esquemas.
Atualização: Série de acordos fez ressarcimento subir para R$ 70,6 milhões nas semanas seguintes.
O contrato fraudulento, fruto da Concorrência n° 01/2014, previa projeto executivo e execução de obras e serviços de ampliação e melhorias do sistema de abastecimento de água no Município. Assinado entre o Daerp e a empresa Engepav Engenharia e Construções Ltda/Aegea Engenharia, em março de 2015, o contrato saltou de R$ 68 milhões para R$ 86 milhões – porém, parte foi paga sem que o serviço tivesse sido realizado.
“Com a proximidade das eleições, muitos espertalhões tentarão disputar a paternidade dessa conquista, mas os documentos oficiais provam quem realmente denunciou e ajudou a Polícia Federal, o MP e a Justiça a colocar na cadeia parte de uma organização criminosa, além de reaver esse dinheiro que é público”, frisou Papa.
O vereador, que presidiu a CPI do Daerp na Câmara, ainda acrescentou: “Essa vitória é de Ribeirão e é fruto do trabalho de um mandato parlamentar técnico, que não emprega cabos eleitorais, mas, sim, assessores qualificados. Esse desfecho mostra também que nem toda CPI acaba em pizza e o que essa importante ferramenta legislativa pode fazer. E, por fim, não foram os deputados da nossa cidade e nem o prefeito atual os responsáveis por tamanha conquista”, enfatizou Papa.
Do ofício de Papa à decisão judicial
Na condição de presidente da CPI do Daerp, Papa oficiou o Ministério Público requerendo o bloqueio de bens e ativos da Aegea Saneamento de Participações S/A – controladora e detentora de 99,99% do capital da Aegea Engenharia Ltda -, de forma preventiva e assecuratória, com base no artigo 14 da Lei Federal n° 12.846/13.
Datados de 7 de novembro de 2016, os ofícios foram enviados por Marcos Papa ao promotor Sebastião Sérgio da Silveira, responsável pela Promotoria de Cidadania, e ao promotor Leonardo Leonel Romanelli, representante do Núcleo de Ribeirão Preto do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado).
Nos documentos, além de requerer que fossem tomadas medidas contra a Aegea S/A no sentido de resguardar o prejuízo ao erário, Papa informou a existência de uma Apólice de Seguro-Garantia no valor de R$ 3,4 milhões, em favor do Daerp, e municiou o Ministério Público com vasta documentação obtida pela CPI do Daerp.
Enviado ao juiz Lúcio Alberto Eneas da Silva, responsável pela 4° Vara Criminal de Ribeirão Preto, um documento do Gaeco, datado de 9 de dezembro de 2016, defendeu junto à Justiça que as medidas de bloqueio de bens e ativos fossem estendidas para a controladora da Aegea Engenharia, no caso, a Aegea Saneamento e Participações S/A.
Assinado pelos promotores Marcel Zanin Bombardi e Leonardo Leonel Romanelli, o documento destacou à Justiça que a proposta foi sugerida pela Câmara Municipal e apresentou anexado o ofício assinado por Marcos Papa, no dia 7 de novembro.
Em decisão datada de 19 de dezembro de 2016, o juiz deferiu o pedido de Papa e determinou o bloqueio de R$ 18.330.545,00 das contas da Aegea S/A. “Considerando que a empresa Aegea Saneamento e Participações S/A é controladora da empresa Aegea Engenharia e Comércio Ltda então o pedido de bloqueio do valor auferido em prejuízo do ente público e medida pertinente, pois se trata, em tese, de produto de crime, que pode ser perseguido, ainda que esteja na posse de terceiro”, frisou na ocasião.
Bloqueio inicial tinha sido infrutífero
O Gaeco pontuou que “pouquíssimos valores foram bloqueados absolutamente incapazes de garantirem a reposição do prejuízo ao erário” referindo-se ao bloqueio inicial contra a Aegea Ltda – sendo cerca de R$ 7 mil na conta da Aegea Ltda e R$ 20,4 mil na conta do diretor e corréu Jorge Carlos Amin, apesar de a empresa ter recebido quase R$ 30 milhões do Daerp entre dezembro de 2015 e agosto de 2016.
Os promotores também enalteceram que o Daerp, após a Operação Sevandija ter sido deflagrada, realizou um levantamento interno e constatou pagamentos a maior superiores a R$ 16,8 milhões em serviços não executados, além de R$ 1,5 milhão pagos em propinas a dois então agentes públicos, os corréus Marco Antônio dos Santos (preso em Tremembé) e Luiz Aberto Mantilla R. Netto.
“Apesar de se tratarem de medidas cautelares extremas, envolvendo bloquear o patrimônio de empresa, são elas absolutamente necessárias para a continuidade das investigações e seu êxito futuro para um resultado efetivo das apurações, possibilitando que a Municipalidade de Ribeirão Preto/SP seja efetivamente ressarcida de danos sofridos, bem como impossibilitando o desfazimento de bens”, frisaram os promotores.
Papa propôs CPI um ano antes da Sevandija
Apesar de a CPI do Daerp ter sido instalada na Câmara em setembro de 2016, Papa a propôs quase um ano e meio antes de a Sevandija ter sido deflagrada – em 05 de março de 2015. Porém, o vereador só conseguiu instalar a Comissão Parlamentar de Inquérito depois que a Operação afastou nove vereadores da base governista.
“Levei a ata da votação na Câmara para o Gaeco. As evidências de superfaturamento e de direcionamento para a Aegea eram evidentes. É grande o volume de documentos que produzimos como prova. Ouvi de um importante membro da Polícia Federal que meu mandato abriu avenidas de investigações para que a PF e o MP se aprofundassem e acabassem com uma quadrilha que arrasou com Ribeirão”, destacou.
Convocados para depor, na época, o presidente da Aegea S/A, Hamilton Amadeo, e o diretor financeiro e de relações com os investidores da empresa, Flávio Crivelari, se negaram a responder as perguntas, amparados por habeas corpus.
“Isso não me impediu de desmascará-los na ONU porque eles eram signatários do Pacto Global Anticorrupção. Quando conseguiram esse contrato, superfaturado e direcionado, fizeram festa na Bolsa de Valores, mas depois escondiam dos acionistas que eram criminalmente investigados em Ribeirão Preto”, reforçou Papa.
Provocado por Papa, MP recomendou suspensão em 2015
Diante das sucessivas blindagens da base governista, Papa provocou o MP, por meio de representação, onde elencou inúmeras irregularidades na Concorrência Pública n° 01/2014, como restrições impostas pelo edital e superfaturamento de preços e superestimativas de quantitativos – majoração de 93,40% no valor dos poços.
De posse de farta documentação, o promotor Sebastião Sérgio da Silveira solicitou informações à autarquia e recomendou em ofícios datados de 13 de março de 2015, à então prefeita, Dárcy Vera, e ao então superintendente do Departamento, Marco Antônio dos Santos, que determinassem imediata suspensão da licitação.
Silveira também oficiou o procurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE) para conhecimento e providências.
CPI recomendou que Aegea fosse declarada inidônea
Apresentado no dia 26 de novembro de 2018, na Câmara, o relatório final da CPI do Daerp recomendou que a empresa Aegea fosse declarada inidônea pelo TCE e ficasse impedida de contratar com a administração pública em todo o País.
Para Papa, a conduta dos dirigentes da empresa violou preceitos constitucionais, em especial os princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência, regras de ordem pública e a isonomia entre os candidatos da concorrência. A CPI concluiu pela irregularidade da Concorrência e da contratação da Aegea apontando direcionamento, falta de planejamento, mau uso do dinheiro público e prejuízo aos cofres públicos.
Também foi defendido pela Comissão que os órgãos competentes apurassem a prática de improbidade administrativa pelos servidores públicos envolvidos, uma vez que condutas ilícitas resultaram em prejuízo patrimonial ao erário em mais de R$ 18 milhões.
Por fim, Papa propôs a apuração da responsabilização das pessoas jurídicas envolvidas no certame nos termos da Lei n° 12.846/2013, a Lei Anticorrupção Empresarial, para que fossem devidamente punidas. “Questionei o atual prefeito pessoalmente, inclusive, durante uma coletiva de imprensa na Prefeitura, para que a Administração não deixasse de agir com base da Lei Anticorrupção Empresarial”, destacou.
Um dos encaminhamentos do relatório final da CPI foi para o Daerp a fim de que tomasse as providências necessárias com vistas a ressarcir os cofres públicos com a interposição de Ação de Ressarcimento ao erário público em face de todos os envolvidos.
O relatório da CPI também foi encaminhado ao Ministério Público, ao Gaeco, ao Executivo, à Comissão de Valores Imobiliários e ao Comitê Brasileiro de Pacto Global, responsável pela Rede Brasileira do Pacto Global na ONU.
Aegea S/A divulga ‘Fato Relevante’
A Aegea S/A divulgou um Comunicado ‘Fato Relevante’, no dia 29 de outubro de 2020, aos associados e mercado em geral sobre a homologação de um Acordo de Não Persecução Cível celebrado entre a Aegea Engenharia e Comércio Ltda com o Ministério Público, o Daerp e a Prefeitura de Ribeirão Preto. “No Acordo, a Aegea Saneamento e Participações S/A se comprometeu a pagar o valor aproximado de R$ 40 milhões ao Daerp, além de ter assumido outras obrigações usuais nesse tipo de transação”.
Assinado pelo vice-presidente de Finanças e Diretor de Relações com Investidores, o Comunicado destaca que “termos e condições do Acordo são sigilosos, nos termos da legislação aplicável, tendo as partes signatárias do Acordo outorgado mutuamente quitação das obrigações decorrentes do contrato celebrado em Ribeirão Preto, bem como atendem ao melhor interesse da Companhia, seus acionistas e stakeholders”.
A Aegea não opera concessões em Ribeirão Preto. “A adesão da Companhia ao Acordo como garantidora objetivou extinguir definitivamente os processos administrativos e judiciais vinculados à Operação Sevandija, como parte do processo de fortalecimento dos seus esforços nas áreas de Compliance e de Integridade Corporativa”, frisa a nota.
Por fim, o Comunicado diz que a Aegea opera ativos de saneamento em 57 municípios através de contratos de concessão, subconcessão e PPPs, que foi fundada em 2010 e que registrou Receita Operacional Líquida de R$ 2,9 bilhões nos últimos 12 meses.
Apesar de a Aegea S/A ter anunciado o ressarcimento dos cofres do Daerp, na ordem de R$ 40 milhões, em nota à imprensa, a Prefeitura de Ribeirão Preto divulgou que a quantia é estimada em R$ 70 milhões. Os valores dos contratos fraudados vieram à público com a Operação Callichirus, um dos desdobramentos da Sevandija.
“Sabe que diferença faz um vereador preparado e com integridade para perseverar e pensar no interesse público? Esse é um bom exemplo, está aqui a grande diferença de um vereador que sabe mostrar como se constrói um discurso político concreto, técnico, que busca o bem comum e que não teme por ir atrás daqueles que estão prejudicando o povo”, concluiu o vereador Marcos Papa.
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